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O Espelho Retrovisor e o GPS

 

Na nossa vivência diária, desde as coisas mais simples ou irrelevantes, até às mais complexas ou decisivas, uma boa parte do que fazemos e experienciamos é resultado de processos inconscientes e que por isso fogem ao nosso controlo racional. Isso por si só, pode ser assustador e como tal potencialmente gerador de medo.

O medo geralmente aguça a necessidade que todos temos de controlar o mundo que nos rodeia. Uma forma de fazer isso é através do cálculo de probabilidades (com base nos dados que disponho acerca da situação é provável que aconteça isto)… desta forma algumas pessoas conduzem a sua vida utilizando dois instrumentos que (pensam elas), contribuem para um maior sentimento de segurança e estabilidade interior: um  espelho retrovisor e um GPS.

O «espelho retrovisor mental» tem como finalidade observar e analisar o que aconteceu, de que forma poderia ter sido evitado, modificado ou potenciado. Serve igualmente para, com base em acontecimentos do passado, tentar (usando lógicas probabilísticas) prever o que poderá acontecer como resultado das nossas acções.

O «GPS mental» costuma ser usado como ferramenta de controle e previsão de acontecimentos futuros, como suporte para a tomada de decisões, no estabelecimento de objectivos ou como projecção do que poderá ser o rumo da nossa vida daqui em diante.

Quando usados de forma moderada e adequada, o «espelho retrovisor e o GPS mentais» são ferramentas úteis e produtivas. Mas já experimentou conduzir o seu carro, olhando apenas para o espelho retrovisor? Ou conduzir olhando apenas para o GPS? Certamente que não o fez. Da mesma forma conduzir a vida apenas com base no passado (usando apenas o «retrovisor mental») provoca bloqueios emocionais, cognitivos e comportamentais que nos impedem de avançar. Não consigo libertar-me do passado; foi uma coisa tão forte que nunca mais esqueci; se não fosse o que me aconteceu, a minha vida teria sido melhor; todos os dias penso no que aconteceu, são frases típicas de quem usa excessivamente as lógicas do «espelho retrovisor mental» na condução da sua vida.

Por outro lado utilizar apenas o «GPS mental» pode potenciar o aparecimento de bloqueios ou eternas indecisões (normalmente frustradoras, condicionadoras e dolorosas). Tenho medo de arriscar; nunca fiz isso, porque acho que vou ter medo; já pensei muitas vezes nessa possibilidade, mas nunca pus em prática; tenho receio daquilo que os outros irão pensar, são pensamentos ou verbalizações próprias de quem usa excessivamente o «GPS mental» como ferramenta de gestão da sua vida.

Enquanto nos distraímos com avaliações e análises excessivas do passado e do futuro acontecem um sem número de coisas dentro de nós e à nossa volta que, se devidamente valorizadas e sentidas, nos permitiriam ser mais felizes e completos no presente e que provavelmente alterariam drasticamente a visão do passado e as perspectivas de futuro.

Ser aquilo que se é, depende em grande parte de encontrar um equilíbrio saudável entre a visão do passado, o vivenciar do presente e a projecção equilibrada (no sentido do balanceamento das expectativas de acordo com o ponto de partida real) do futuro. No fundo aceitar sentir o que realmente se sente (sem distorções ou disfarces, seja positivo ou negativo, prazeroso ou doloroso, aceitável ou não aceitável) capacita-nos e equipa-nos com instrumentos emocionais, cognitivos e comportamentais de grande utilidade e validade para a construção do futuro. Assim, concerteza não se sentirá preso ao passado ou incapacitado por uma projecção assustadora do futuro.

 

Rolando Andrade

Psicólogo Clínico

Psicoterapeuta

Cédula profissional O.P.P 4365